quarta-feira, 23 de julho de 2008

GOVERNOS DE UNIDADE NACIONAL


QUE FUTURO PARA A DEMOCRACIA EM AFRICA?
Artigo Publicado no Autarca da Beira

Sem estudar ciência política todo mundo percebe a democracia como o sistema de governo onde o povo é que, para todos os efeitos, indica os seus legítimos representantes e a eles delega o exercício do poder político.

Na verdade, acontece que, o povo, através de eleições livres, justas e transparentes, indica as pessoas que quer que governem em seu lugar. Eleições livres e justas permitem que, tanto os que elegem como os que são eleitos tenham as mesmas oportunidades e exerçam as suas liberdades fundamentais de forma plena.

A democracia não pode em nenhum momento existir num contexto em que os dirigentes se auto elegem ou se auto indicam para governar, pelo simples facto de que esses modelos significam ditadura ou autoritarismo. Formas de governo que a história vem rejeitando com razões muito óbvias.

A história em si, vem afirmando a democracia como a melhor forma de governo para as sociedades humanas. Seja ela directa ou indirecta, sempre deve vincar o princípio segundo o qual é o povo no poder e a soberania nele reside.

Eu quero acreditar que a democracia é uma faculdade de homens livres. Se o ser humano não é livre ele não pode constituir-se integrante de uma sociedade democrática.

Hoje, a maior parte dos Estados africanos consideram-se livres e democráticos, mas a verdade é que não chega a um quinto de todos países africanos que nos padrões de liberdade e democracia poderiam realmente serem tratados como tal.

Poderiam questionar-me sobre os termos de referência desses padrões e quem é que os estabelece. Essa seria outra discussão, mas eu prefiro continuar acreditando que nessa coisa de padrões, há princípios universais e relativos, sendo que, os padrões de medição da democracia e liberdades com que concordo, para esta discussão, são os universais, os absolutos e não os relativos.

Na verdade me preocupa o facto de, mesmo não sendo um continente que se pode afirmar democrático, embora assim se considere constitucionalmente, hoje, em África, assiste-se um cenário que na minha óptima significa um grave atentado a democracia no seu verdadeiro sentido. Ou seja, se a África ainda não tinha chegado a metade da essência da democracia, hoje tende a dissociar-se de tudo que fez em busca de governos democráticos.

Tivemos duas eleições muito conturbadas na região Austral de África. A primeira no Quénia e a última no Zimbabwe. As duas eleições aconteceram em um intervalo muito próximo dentro de um ano, foram da mesma forma acompanhadas de sérias violações de direitos humanos, restrições de liberdades fundamentais e acima de tudo fortes indícios de fraude eleitoral e cumplicidade das Comissões nacionais de Eleições com o partido no poder.

As aposições nesses dois países recusaram os resultados publicados. No Quénia renasceu a violência que só terminou com a criação de um governo de unidade nacional, onde o suposto vencedor das eleições tornou-se o Presidente da República e o vencido Primeiro Ministro. O Zimbabwe caminha para lá.

Nos dois cenários, esse entendimento foi conseguido graças a intervenção de mediadores, que na verdade são lideres internacionalmente reconhecidos. Para o Quénia, o antigo Secretario Geral das Nações Unidas e para o Zimbabwe o actual presidente da África do Sul.

O Governo de Unidade Nacional, pressupõe a revisão constitucional e a alteração imediata do modelo de governação anteriormente existente. Não basta que o suposto vencido nas eleições seja Primeiro Ministro. É importante que a figura de primeiro ministro tenha conteúdo e não seja uma mera figura cosmética como acontece em Moçambique onde mesmo existindo, o Presidente da Republica é ao mesmo tempo Chefe do Estado e do Governo.

Para quem participa nas eleições e percebe que ganhou as eleições, tendo provas concretas, inclusive apoio de observadores externos, não sei até que ponto acaba aceitando a manutenção dos resultados em troca de cargos públicos. Embora se mostre evidente que o Governo de Unidade Nacional contribui para o fim da violência, ilustra ao mesmo tempo a fragilidade das instituições democráticas nos Estados africanos.

Por um lado significa também que o povo ainda não tem sérios candidatos ao poder que no final do dia venham realmente exercer o poder político em sua representação. Por outro lado, o mesmo cenário ilustra o quanto a ambição pelo poder está acima dos interesses da maioria e da construção de Estados comprometidos com a causa humana.

Pessoalmente temo que o precedente do Quénia e agora claramente visualizado no Zimbabwe, venha a ser o caminho a ser seguido por outros Estados como Moçambique, Angola, África do Sul, Tanzânia e outros que em vésperas de eleições, o partido no poder se mostra cada vez mais dividido, incoerente e a espreita de uma crise de liderança.

Embora os partidos na oposição nesses países não estejam a dar passos significativos, o papel dos eleitores, no caso de não se absterem em massa, pode determinar uma mudança drástica no curso acostumado pelos que estão no poder.

A ser assim, receio que estejamos criando em África, um ambiente favorável para o fim da democracia e a introdução mascarada de dois conceitos puramente perigosos a sociedades que se pretendam civilizadas: o primeiro é a ditadura e o autoritarismo e o segundo é o golpe de Estado.
Autoritarismo e ditadura porque os governantes no poder não são mais eleitos pelo povo. sendo que não estão mais em representação deste, pois são ilegítimos e ali posicionados graças ao uso da forca e consentimento de compadres.

Golpe de Estado porque é uma forma de retirar o poder àqueles que por força do voto da maioria realmente o mereciam e estavam para tal credenciados, mesmo sabendo que essa nova forma de golpear o poder tem o consentimento da SADC e de alguma ala das Nações Unidas.

Isso para mim é suficiente para questionarmos o tipo de democracia que pretendemos construir em África e qual o futuro que pretendemos moldar para os africanos sabendo que as violações de Direitos fundamentais permanecem e se avolumam, bem assim os focos de violência e intimidação.

Como podem perceber, não abordei o comportamento destes quando estão no poder, essa matéria será provocada na próxima edição.

Mais não disse.

6 comentários:

Anónimo disse...

Caríssimo,

já conheces a minha posição sobre a ganância doentia pelo poder de que padecem os dirigentes africanos.Mas o pior não é a ganância em si, é essa indiferença, que mais parece uma nostalgia pelo passado não democrático, que o povo africano adopta perante esse ressurgir de formas ditatorias de governo.E quanto á história meu amigo, acabei sabendo com Aldous Huxley em " a condição humana", e concordo plenamente com ele, que " a grande lição que se extrai da história, é que nada se aprende com ela", é mais ou menos isto que fixei dessa grande inteligência.

Sabes Custódio, eu amo incondicionalmente o ser humano, mas que bicho hem?

um abração

Anónimo disse...

meu caro, alcanço a sua inquietação. infelizmente sou da opinião contrária. na verdade, olho para os GUN, como ganhos, porque só aceitar conviver com o oposto, com quem pense de forma diferente em àfrica, acredite é mesmo um ganho. não acredito em modelos de democracia, contudo, acredito que o povo tem direoto à escolha e deve ser o mesmo a legitimar o poder, mas tal, só será possível com o povo (cidadão) esclarecido.
acredite os GUN, não são a arma que é a sigla, a mim, me parecem formas não forçadas de àfrica entrar para um processo que o ocidente e companhia trilharam a já muito tempo...é como bem dizes esta, acalma a violéncia, senão silencia-o e lanço, uma pergunta de provocação ò caro Dr.de que a àfrica realmente precisa, senão do fim da violéncia que eclode por tudo e por nada? Amosse Macamo

Anónimo disse...

sr. Macamo,

concordo consigo qdo afirma serem as GUNS, ganhos na medida em que se cria uma possibilidade de partilha de poder entre as várias facções políticas dentro de um mesmo país.o que não concordo, é que esta partilha seja forçada através de "golpes de Estado" nos dizeres do Dr Duma, pois a calmia que se obtém através destes "arranjos políticos" pode ser simplesmente uma ausência de guerra. E ausência de guerra, não significa necessariamente PAZ. E a paz assim obtida, pode ser um barril de pólvora à espera do momento proprício para explodir.

Anónimo disse...

concordo plenamente quando dizes que ´´democracia é uma faculdades de homens livres´´.mas, os nossos lideres devem saber que a democracia ou librdade, não significa somente alcançar a independencia como um facto historico,pois, para mim, este termo: independência, pressupõe : igualidade, liberdade: economica, de expressão, livre escolha..... e muito mais.
coisas que aquele povo africano que sempre anseiou saborear o mel de uma democracia aproximadamente pura... nunca sequer chegou a sentir o cheiro.
no fundo, acredito que na epoca colonial, tinhamos uma causa aceitavel para o desreipeito pelos direitos humanos.
e hoje... qual a causa?
humilhados e mal tratados por irmãos da mesma barriga... mãe AFRICA.
Mas.... termino dizendo que: a liberdade ou democracia que tanto queremos depende de nós... se disser-mos a todo o mundo o quanto nos sentimos indignados pelo desreipeito pelos Direitos Humanos nesta Africa... um dia um irmão negro vivera uma Africa melhor.
Fiat justitia pereat mundus

Anónimo disse...

Caro Guanazi,
pensei que o Duma tivesse estabelecido um paralelismo no sentido dos GUN, representarem uma forma de golpe de Estado, pois, contrários a vontade popular e a ordem que se pretendia com a eleição. ora, se a questão se colocar mesmo no sentido de golpe de estado, e daí formar-se um GUN, também, não devo concordar,pois os golpes são sempre viciados e viciam..Amosse Macamo

Unknown disse...

Ola
Quero antes de mais saudar todos os comentadores neste topico. Continuo muito ceptico quanto a forma como os antigos libertadores da patria Africa querem governar o continente.
Mais do que uma questao politica 'e tambem uma questai economica e social. A verdade 'e que, uma politica, por mais boa que seja, quando nao consegue garantir liberdades, igualdade e justica social nao deve ser pregada.
'E claro que o povo africano nao 'e ignorante, mas temos que saber que a maioria nao sabe ler, nao sabe escrever por conta disso quase que nao tem acesso a informacao. Nesses moldes ele nao pode participar activamente nos processos democraticos propostos, alias, nem pode critica-los.
Hoje debate-se a questao da xenofobia e uma das causas levantadas 'e que os sul africanos, embora aceitem o branco em cima deles, todos os outros africanos devem estar em baixo deles...ve se pode!
Como 'e qu podemos ter uma integracao regional com dificuldades de conviver com o diferente?
O desafio 'e grande...muito grande