quarta-feira, 20 de junho de 2012

A Propaganda Política, os Papagaios, os Fantasmas e a Manipulação da Opinião Pública


Parte 2

As eleições autárquicas de 2008 e as eleições gerais de 2009 definitivamente chamaram a atenção dos políticos a um público emergente que até então era na arena política ignorado: os cibernautas!

O bum dos blogs e redes sociais entre meados da década passada não tinha constituído uma mais-valia ao apelo político nem foi visto como um instrumento para a propaganda política, afinal de contas, estavam em alta as novas televisões que acabavam de quebrar a hegemonia da TVM e aos poucos se alastravam pelo país fora. Assim também cresciam as rádios FMs nas principais cidades do país e os jornais que se diziam independente, no mesmo período, se multiplicavam de forma aliciante. Quem podia controlá-los tinha a maior parte do público para garantir suporte.

Entretanto, avitória de DavizSimango nas autárquicas da Beira em 2008, bem assim como, o grande debate que essa vitória levantou nos blogs, nas páginas da internet e sobretudo nas redes sociais, onde uma parte dos jovens urbanos já se fazia presente, principalmente no facebook, que aos poucos suplantava o hi5 e “companhia”, significou uma oportunidade de afirmação política de uma outra camada de jovens que não tinha muita expressão nos movimentos organizacionais e reuniões das juventude partidária.

Em grande medida, jovens de vários municípios distantes da Beira simpatizavam-se com a vitória de DavizSimango que acima de ser uma vitória normal de um simples Edil, constituía um uma vitória sobre o domínio prepotente da Renamo e da Frelimo nos escrutínios nacionais, já que ele, nessas eleições, concorrera como independente. Todavia, mais do que um apoio ao Daviz, esses jovens apoiavam sim a mudança, a alternância na governação e a inclusão de novos actores na arena política nacional.

O facto veio a repetir-se nas eleições gerais de 2009, onde depois de conturbadas validações de candidaturas para as legislativas a vitória foi maioritária para a Frelimo e para o seu Candidato Armando Guebuza. Contudo, marco curioso foi que, o Candidato da Frelimo, Armando Guebuza, perdera relativamente a favor de DavizSimango em algumas mesas de votação na zona de cimento da cidade de Maputo, incluindo onde ele mesmo teria votado.

Estava claro que a maior parte dos votantes nesses locais e outros locais também de cimento ao longo do país era indubitavelmente composta por jovens e por um grupo de recém- adolescentes que votavam pela primeira vez. Um cruzamento nas bases de dados do Instituto Nacional de Estatística revela que o número dos novos votantes vai crescendo a cada ano, sem contudo, isso significar a redução das abstenções.

É a partir daqui que o campo virtual começa a chamar a atenção especial dos políticos e principalmente dos partidos políticos mais expressivos no país, naquela altura. Surgem imediatamente páginas virtuais dos tais partidos e páginas virtuais de seus representantes. Os principais líderes políticos do país começam a criar seus perfis nas redes sociais e virtualmente começam a interagir de forma mais directa com aquele público constituído por jovens cibernautas. O mundo virtual deixou de ser indiferente aos políticos, ou, pelo menos, estes deixaram de ser indiferentes em relação ao mundo virtual.

Entretanto, sempre ficou claro que a percentagem dos votos oferecidos pelos jovens cibernautas, não era suficiente para fazer grande diferença, principalmente quando se trate de eleições presidenciais e legislativas. Mas podem fazer grande diferença nas eleições municipais. Deve ser por isso que os partidos políticos, interessados no poder, a partir de certa altura, começaram a dar uma especial atenção a esse grupo de jovens e as suas redes de contacto.

A promoção de jovens políticos com habilidades de granjear atenção e produzir debates nas redes sociais foi notória tanto a nível do Governo assim como a nível municipal e partidário. A palavra desses jovens outrora críticos ao sistema passou a harmonizar-se com o discurso das novas fileiras abraçadas e, novas técnicas de sobrevivência tinham que ser criadas, sendo uma delas dividir para reinar e a outra a humilhação dos seus opositores.

Como em qualquer irmandade, os novos convertidos, buscando estabilidade e respeito, voluntariamente ou não, submetem-se a testes de coragem, fidelidade e criatividade. Repudiam completamente o seu passado e glorificam como a um salvador a sua nova liderança. Manifestam publicamente que assumiram novas crenças e que o passado não passa disso. A partir dai, o comportamento políticoé outro e exemplos disso não faltam no nosso contexto.

Os cibernautas também conseguem ultrapassar as barreiras do tempo, das distâncias e as formalidades exigidas em alguns fóruns de debate. Estão em todos os lugares em todos os momentos. Em certa medida, acabam sendo um dos grandes instrumentos para a promoção da política externa nacional, na medida em que estão no constante diálogo com a diáspora e outros actores políticos no mundo. A sua campanha e propaganda política passam a ser permanentes e sem muitos impedimentos legais.

Entretanto, ficam gravadas as incursões pouco elegantes dos papagaios e dos fantasmas, que aproveitando-se dos meios que a tecnologia oferece, abdicam de contribuir de forma isenta na construção de uma moçambicanidade cada vez mais responsável, participativa e inclusiva, para dedicarem-se a subversão da informação e ao linchamento público dos seus opositores para acima de tudo granjearem a auto promoção no veiculo da mídia dominante.

O poder, como veio a mostrar-se em 2009 e 2010, ensaiou manobras de controlo do uso dos celulares. Se era fácil controlar os conteúdos noticiosos e de opinião que podiam ser passados nas rádios e televisões, bem assim como manipular a escolha dos respectivos intervenientes nesses espaços, difícil era controlar a origem e o “esquema” de disseminação de informação por via de celular, alias, maioritariamente, os jovens que fazem parte das redes sociais, usam o celular, (os tais “smart”), para terem acesso ao mundo e também, para a ele se exporem.

O celular, com todas as facilidades que oferece, olhando para o número dos seus utentes no país, de longe ultrapassa o público que pode ser atingido pelas TVs tanto por cabo como por satélite, facto que o coloca como um importante instrumento de propaganda. Diga-se de passagem que não só o celular é um importante meio de propaganda, mas também as empresas de telefonia móvel, até porque, para além de todas serem directamente controladaspelo poder, uma delas, em parte, pertence a um dos mais importantes partidos do país.
Continua…

A Propaganda Política, os Papagaios, os Fantasmas e a Manipulação da Opinião Pública


Parte 1

As manifestações populares de 5 de Fevereiro de 2008 influenciaram o comportamento dos principais partidos políticos moçambicanos no que tem a ver com o seu modus operandina abordagem da opinião pública. A caminhada para as Eleições Autárquicas desse mesmo ano e as Eleições Gerais de 2009 viriam de alguma forma a ser o palco de teste de novas metodologias na abordagem dos manifestos e na angariação das massas.

Os manifestados populares de 5 de Fevereiro, teriam sido convocadas por via de sms distribuídas por celular. Nessa época, as duas principais companhias de telefonia móvel estavam a competir na distribuição gratuita de SMS Short MessageService” (Serviço de mensagens Curtas), o que de certa forma “facilitou e financiou” toda a estratégia das manifestações e que olhando para as consequências, teriam surtido o efeito dos seus promotores.

O MISA Moçambique e o Centro de Integridade Pública, emitiram dias depois, um comunicado de imprensa repudiando a forma pujante com que o Governo controlou os órgãos de comunicação social públicos e privados. A censura da transmissão de imagens pelas principais televisões teve início por volta das 9 horas do dia 5 de Fevereiro, quando a STV deixou de mostrar as imagens das manifestações e começou a passar uma novela e a TVM passou a transmitir reportagens sobre o CAN. Nas horas seguintes nenhuma outra imagem sobre as manifestações teria sido passada e nas notícias da noite, somente alguns trechos foram repetidos pela STV.

Fontes em contacto com o MISA e com o CIP confirmaram que os responsáveis pelas emissões na TVM e na STV teriam recebido “ordens superiores” para vigiar “conteúdos noticiosos subversivos”. Os repórteres da Rádio Moçambique “que se encontravam em vários pontos das cidades de Maputo e Matola foram obrigados a interromper as reportagens em directo”. O Jornalista Emílio Manhique teria convidado no dia seguinte as manifestações, o sociólogo Carlos Serra ao seu programa “Café da Manhã”, Serra recebeu informações que o programa teria sido cancelado e, no dia do programa passou na RM um outro sobre o HIV e SIDA.

A nível dos blogs, das páginas da internet e nalguns grupos de e-mails, um pequeno exército de “papagaios” foi criado para inverter a verdade dos factos e rotularem de oportunistas, vândalos, subversivos, apóstolos da desgraça e desordeiro todos os manifestantes. Nesses grupos chegou-se a afirmar que as manifestações teriam sido convocadas por “mão externa”.

O mesmo exército de “analistas papagaios”, foi criando e difundindo mensagens ridicularizantes contra analistas que não se tinham alinhado ao pensamento que pretendeu calar a mídia e o discurso dos manifestantes. Para quem não sabe o que significa “analista papagaio” deixo ficar um conceito elucidativo: “é analista papagaio, aquele que deliberadamente aliena sua consciência para dar lugar a uma repetição em série, de ideias preconcebidas e orientadas a partir de uma determinada sede com vista a ridicularizar e descredibilizar a pessoa e a mensagem dos seus opositores, assim como para manipular a opinião pública. A repetição em série das ideias orientadas, acontece usando como recurso os canais televisivos, as rádios, as redes sociais, os blogues, os sites e outros meios de comunicação social.”

Facto curioso é que nas vésperas dasEleições Autárquicas acontecidas em Outubro de 2008, as várias redacções das TVs e Rádios começaram a receber listas de quem devia ser convidado como comentador e quem não devia ser convidado. Foi assim que surgiu uma nova rede de comentadores jovens, sendo muitos deles os tais analistas papagaios acima descritos. De onde vinham as listas? Elas vinham das principais sedes partidárias e gabinetes de alguns ministros.

Assim foi feito o debate pós 5 de Fevereiro, assim foi feito o debate da pré campanha nas Eleições Autárquicas de 2008 e assim foi preparada a précampanha, a campanha e o debate eleitoral de 2009. Afinal tudo tinha a ver com o poder. Era preciso controlar a informação que era veiculada no país, era necessário saber quem a difundia, de onde a difundia e quais eram os interesses que orientavam essas informações. Aqui começou a formar-se uma nova forma de estar no que tem a ver com a política. Inventaram-se novas formas de propaganda e foram gerados os analistas fantasmas.

Os analistas fantasmas viriam a ser uma reprodução infinita dos analistas papagaios. Deixe-me construir o conceito de um analista fantasma: “o analista fantasma é aquele que, sendo reprodução do analista papagaio, ou reprodução de um outro analista fantasma e, embora com a mente alienada, somente existe no mundo virtual e emite mensagens e informações com a mesma finalidade do analista papagaio. Contudo, nem sempre o analista fantasma é alinhado ao papagaio, na verdade, ele também pretende dar ao público a percepção de que existe um palco com diversidade de opinião e diversidade de “opinionmakers”.

Piores que os analistas papagaios, sãos os analistas fantasmas que fisicamente não existem, não possuem ideias próprios, porque não existem e nessa qualidade não podem ser, a olho nu, vistos, contactado ou responsabilizados e por isso, são eles, devastadores, gladiadores, mal criados e seguidores acérrimos dos analistas papagaios, ou seja, acérrimos seguidores de si mesmo, porque na verdade, o analista fantasma é a versão virtual do analista papagaio.

Para acomodar essa nova onda de recrutas (entenda-se dos papagaios), novas vagas foram criadas nas sedes, nos municípios e em algumas direcções, sejam elas municipais, distritais, provinciais ou mesmo nacionais. E para alem de se promoverem os tais recrutas, também se empregaram e difundiram-se com veemência a ideia da recompensa de quem se alinha. Festas familiares e convívios de grupos passaram a servir de palcos de ostentação dos benefícios ganhos nas novas fileiras recrutadas e alinhadas para controlar e manipular a informação e a opinião pública.

Aqui sobressaiu uma nova forma de pensar e fazer a propagada política. A propaganda, um meio, que no passado foi bastante explorada pelo nazismo e pelo comunismo, para criar medo e terror, para criar ódio contra pessoas de crenças e opiniões diferentes, para criar um falso valor de superioridade, de segurança e estabilidade, para lembrar a grandeza e as conquistas do passado e do presente, para rebaixar os inimigos, para divinizar o líder e acima de tudo para manipular a informação e a opinião pública passou a ser o instrumento dos analistas papagaios e principalmente dos analistas fantasmas.

Os analistas fantasmas, repetindo incansavelmente as ideia dos analistas papagaios e sobretudo os objectivos das sedes, atacam osseus contrários, através da criação de bodes expiatórios, desaprovando ideias contrárias, rotulando e ridicularizando os analistas não-alinhados, simplificando a forma de debate, produzindo conceitos vagos e apelando a emoção dos participantes. Com a finalidade de se engrandecerem cada vez mais, os analistas papagaios e os fantasmas usam a técnica do auto elogio e promoção mútua de forma abnegada e chegam a transformar os vários espaços de debate público em puteiro em tempos de orgias.
Continua…