A Voz que se Imortalizou
Acompanhei com muita dor e tristeza a morte de João Paulo, o verdadeiro Blues Man Moçambicano, o JP ou simplesmente o Real McCoy como os amigos mais íntimos o chamavam.
Não pude resistir ao choque nem a dor que momentaneamente tomou conta de mim. Como verdadeiro amante e coleccionador de Blues, eu adoro sem dúvidas nem hipocrisia toda a vida de João Paulo.
Amo o seu estilo, a sua voz, a sua identidade e tudo que ele acreditava. João Paulo é um ídolo para mim e isso nunca escondi a ninguém.
Alguém me falou há dias que tinha sentido a ausência do João Paulo no Goa. Sim, esse era o seu lugar preferido e ele até perdoava as pessoas que achavam ou falavam mal desse seu gosto pelo Goa, pois para ele, aquele não era um lugar qualquer.
Para João Paulo, o Goa não era um simples bar, o Goa era o seu Bourbon Street. Ali ele fazia a sua viagem pelo French Quarter em New Orlean e podia ouvir centenas de bandas de Blues a tocar ou ensaiar para fazer delirar os turistas que não param de chegar e apreciar.
Bourbon Street quase que não tem nada dos Estados Unidos. Uma rua sem grande tráfico, sem prédios altos e sem muita agitação. Tudo é paz. Esse era o lugar de João Paulo, o Goa, o seu Bourbon Street que contrasta bastante com a Avenida Eduardo Mondlane.
New Orlean situa-se estrategicamente ao longo do delta do Mississipi. Rio e lugar que João Paulo sempre mencionou quando subia ao palco. Lugar que não sei se conheceu mas amou, porque o Blues dali não é para os ouvintes, é para si, é para quem canta, um imperativo de vida.
João Paulo será para sempre lembrado pela voz ímpar com que se expressava. E quem pintar João Paulo colocará na sua mão um copo com whisky velho sem gelo. Se não fosse assim, João Paulo não seria um Blues Man.
Quem conhece a historia do Blues e conhece João Paulo fará menção de que o homem foi fiel a farda e que ao destino o homem não traiu. João Paulo viveu como mandam as regras do Blues que abraçou enquanto jovem, tendo se notabilizado nos Monstros, chegando a ser cabeça de cartaz em muitos lugares dentro e fora de Moçambique.
Lembro-me que no ano passado João Paulo afirmou em palco que em todos os anos de carreira nunca caiu no palco e que não gostava que o chamasse por JP porque tinha um nome completo e que por sinal tinha o apelido Macamo, xará do meu amigo que ele chamou de Papagaio.
Lembro-me ter encontrado o João Paulo na Catedral correndo ao palco com seu chinelo na mão. Lembro-me de ouvir João Paulo dizer que este país precisa de jovens corajosos e firmes nos seus ideais. João Paulo não se simpatizava com a cobardia.
João Paulo era um homem firme, não se esquecia das pessoas com quem falava, nem dos assuntos que tocava. Vivia sua vida como um homem honesto que acreditava no poder da arte que seguia e olhava para o Blues como a sua principal arma de batalha, assim também como a água que vigorava sua vida.
João Paulo foi um Blues Man revolucionário e sob esse ponto de vista influenciou minha vida de forma positiva.
Não sei se outra voz aparecerá para cobrir o espaço por ele deixado nos bares onde em noites de Blues nos encontrávamos. A verdade é que a sua voz não se vai apagar jamais e sempre beberemos um copo em memória do Moody Waters como eu o Macamo o chamávamos.
PAZ A SUA ALMA
DESCANSE EM PAZ IRMÃO!
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