Estive a conversar com a minha amiga Unaiti e ela fez-me uma pergunta: imagine que no dia 28 todos os eleitores que forem votar o façam nulo. Ou seja, todos os votos encontrados nas urnas sejam nulos. O que vai acontecer a seguir? A continuidade do governo? A realização de novas eleições? Ou a existência de um estado sem governo? Mas isso é possível?
Não sei de onde ela tirou a ideia, mas a pergunta fez-me pensar em monte de coisas não só sobre as eleições, mas o fim do presente mandato e os resultados que se podem esperar das eleições que se vão realizar.
Quando um mandato termina, sempre fazemos uma avaliação para perceber os avanços e os retrocessos do governo que esteve durante os cinco anos que agora findam. Cinco anos parece pouco tempo, mas é muito. E as vezes parece muito tempo mas é pouco.
Cinco anos é muito tempo para quem está a governar e não sabe o que fazer. É muito tempo para uma oposição que só sabe aparecer na época das eleições. É muito tempo para todos aqueles que esperam o momento eleitoral para se enriquecerem mais um pouco. Muitas vezes, é a cabeça das pessoas que dita a velocidade do tempo.
Mas, cinco anos é pouco tempo para quem está a governar e sabe o que está a fazer. É pouco tempo para quem está no poder a viver folgadamente a custa dos impostos. É pouco tempo para uma oposição que trabalha, trabalha e se preparar para participar activamente não só no processo de governação, mas nas eleições, esperando ganhar acentos no parlamento e a presidência da república.
Se cinco anos são poucos ou muitos na óptica em que olhamos os partidos e seus representantes, o cidadão comum vive os mesmos dilemas ao longo dos cinco anos. É pouco tempo para quem está apressado e muito tempo para quem está a espera. Muita gente está a espera. A espera de um novo emprego, de um novo salário, de uma casa, de uma graduação, de um casamento, de uma ida ou de um regresso.
Mas ok, o que isso tudo significa para nós cidadãos comuns? Significa que cada cinco anos têm a sua história, tem as suas pessoas, os seus partidos e os seus acontecimentos. Cada cinco anos marcam definitivamente uma existência, uma revolução, um ser e um não ser. Infelizmente, em termos de poder, Moçambique nunca conheceu um outro partido maioritário senão a Frelimo. Digo infelizmente não porque seja mau, mas porque nunca conhecemos o outro lado da coisa, mais concretamente: os moçambicanos nunca conheceram um país sem a Frelimo.
E como eu tenho dito em muitas ocasiões, votar é governar. Cada voto que se deposita é uma manifestação do tipo de governo, do tipo de exercício de poder que se almeja e o povo moçambicano, embora não consciente, na sua maioria, consegue exercer esse poder com alguma responsabilidade.
Mas governar sem instituições é utopia. Ninguém consegue governar sem instituições democráticas. E não basta que sejam instituições. É preciso que essas instituições sejam credíveis, estáveis, respeitadas e que se pautam na lei, na legalidade e nos mais nobres princípios da justiça. Esse é o desafio de Moçambique: estabelecer instituições que sejam legitimas, do ponto de vista de aceitação pela maioria da população.
Das mil perguntas que se podem levantar depois do dia 28 eu escolhi somente 3. São elas: e se ninguém for as urnas votar, ou se todos que forem as urnas votarem nulo? O que vai acontecer? Essa é a pergunta da minha amiga e eu pensei muito nela porque faz sentido. Como é que seria interpretado isso e como é que nós cidadãos haveríamos de viver?
A segunda pergunta é: e se dos que forem votar representarem somente 20 ou 30% dos eleitores inscritos? E se desses 20 ou 30% somente um terço ou menos que isso votar ao partido e ao candidato que ganhar, que consequências teríamos em termos de legitimidade? Pode aceitar-se que um candidato e um partido que foram votados por somente 5 ou 10% dos eleitores capazes seja legitimo e seja aceite por todos os mais de 21 milhões de cidadãos?
A terceira pergunta tem a ver com uma hipótese de certa forma muito sensível e que é: um candidato da oposição ganhe as eleições. Estamos a falar de Dhlakama ou Daviz Simango. E Guebuza perca as eleições. Eu nem quero entrar na questão dos partidos que eventualmente terão assentos no parlamento. Mas que país teremos com um presidente da republica que não vem da Frelimos?
A minha questão não é um duvidar das capacidades da oposição, mas é que a realidade é muito desafiadora: temos um governador do banco que é membro da Frelimos. Temos um Procurador Geral da República que é do partido no poder. Temos os maiores empresários que são do partido no poder. Temos quase todos os PCAs das maiores e mais importantes empresas que são do partido no poder. Não só, uma boa parte das empresas que existem são de figuras sonantes do partido no poder.
As principais instituições democráticas e outros são dirigidos por membros do partido no poder estamos a falar do Conselho Constitucional, do Tribunal Constitucional, do Tribunal Administrativo, quem sabe também da Comissão Nacional de Eleições e muito mais. Esse cenário é tenebroso. Não pode ser pacifico e esse presidente não vai sobreviver muito tempo no poder: ou vai abandonar por iniciativa própria ou vai ser obrigado a faze-lo sob pena de ser assassinado.
No meio disso tudo, é o cidadão que vai chorar. Só o cidadão é que vai sentir a dor do exercício de cidadania e a dor do seu voto, já que votar é governar. Mas há que ter coragem de enfrentar as adversidades e a alternância do poder, que é por si, uma adversidade necessária, já que nenhum país que se considere democrático deve fugir da alternância do poder.