quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Direitos Humanos, Criminalidade e Polícia

A Crise da Sociedade Moçambicana


Os Direitos Humanos, embora situações inerentes a todos os homens em todos os lugares, sem excepção, sempre foram vistos como coisa de bandidos ou da oposição. Embora os activistas de Direitos Humanos se tenham acostumados a esse rótulo, na verdade constitui abordagem extremamente preconceituosa e equivocada dessa parte da sociedade.
Esse preconceito e equivoco muitas vezes é alimentado pelo poder e pelos políticos que querendo manipular a mensagem dos Defensores de Direitos Humanos ridicularizam o seu papel no desenvolvimento humano, promoção e defesa dos Direitos Humanos.
Moçambique, embora tenha logrado consideráveis avanços na defesa e promoção dos Direitos Humanos, principalmente no que concerne a adopção de certa legislação concernente e esforços para a criação de uma Comissão Nacional para os Direitos Humanos, continua sendo palco de graves violações, onde a própria efectividade dos Direitos Humanos continua uma miragem.
Grande obstáculo no trabalho dos Direitos Humanos tem a ver com a dificuldade de compreender o que são os direitos humanos, a quem dizem respeito e quem deve garantir a sua efectividade no Estado. Alias, um Estado só pode observar os Direitos Humanos se realmente for de Direito.
Para alem das graves violações de Direitos Humanos a que nos temos acostumados dia a dia, a onda de criminalidade tem vindo a crescer de uma forma assustadora o que nos leva a questionar a existência ou não de uma política de segurança que seja conhecida e cumprida por todos intervenientes sociais.
Na verdade não é possível combater a criminalidade sem uma política pública clara para o feitos e mesmo existindo tal política, se ela não é apropriada pelos agentes do Estado que têm a obrigação directa para o efeito também estaremos distantes de vermos o problema resolvido.
Moçambique está agora sendo atormentado pela onda de crimes contra agentes policiais, o que numa leitura simplista pode parecer comportamento normal de criminosos ou bandidos, o que não pode ser verdade pois as ameaças contra a força pública e contra a lei e a ordem só podem significar ausência da consciência da sua existência ou realmente desafio e afrontamento.
Estamos seriamente preocupados com a onda de criminalidade contra polícias. Em menos de uma semana cinco agentes policiais foram barbaramente assassinados em via pública e até agora faltam explicações sobre as circunstancias e eventuais autores dos crimes.
Os policias antes de mais, são cidadãos e filhos da nossa sociedade, são nossos irmãos, amigos, pais, irmãos e primos, dai que uma tal perda, constitui antes de tudo uma perda de pessoas que farão grande falta no convívio familiar a que pertenciam.
Sendo assim, a Liga Moçambicana dos Direitos Humanos endereça as suas mais sentidas condolências as famílias enlutadas e desde já exige que o Estado não deixe impune tais criminosos. O Estado é obrigado a persegui-los e fazer a justiça no sentido de motivar os outros agentes na sua actividade de combate e prevenção do crime.
Estamos acostumados a um estado em que os autores dos crimes nunca aparecem, nunca são punidos exemplarmente, nem são ao menos retirados da cena. Queremos em crer que esforços estão sendo feitos para a curto prazo os cidadaos possam recuperar a tranquilidade e a paz de espirito tanto nas vias públicas como nas suas casas e postos de trabalho.
Contudo, temos que acreditar que esses cidadãos baleados mortalmente por criminosos, embora a paisana, eram polícias e estavam em serviço. Isto quer dizer que estavam na sua actividade normal de garantir a lei e ordem, a prevenção e o combate ao crime, embora tenham eles mesmos passado a vítimas de actos criminosos.
Essa atrevida actuação de criminosos pode significar uma fraqueza das nossas forças de segurança e ordem, pois, é quase incompreensível como é que aquele para quem sobrecai a responsabilidade de defender não consegue ele mesmo defender-se, pode por ventura um cego guiar outro cego?
O caso da última sexta feira não é isolado, é o desenrolar de uma sequência de perseguição a agentes policiais e até de esquadras onde os, criminosos são capazes inclusive de recuperar sua viatura sob custodia policial. Isso suscita várias perguntas pois todos nós sabemos que o policia, para alem da sua condição de cidadão mais qualificado, ele representa o Estado e é um dos principais porta voz da autoridade e do poder, a ele é conferido o uso da força e das armas, para o efeito.
Essa perseguição e assassinato de polícias embora o pronunciamento do Comando seja de que a principal causa de tal acontecimento tenha sido a fuga de informação, significa antes de mais que a nossa polícia, embora ela mesma garante de segurança, trabalha sem elementos de segurança necessária para desempenhar suas funções. Isso significa que as condições de trabalho a que a nossa policia é deixada a tornam alvo fácil dos bandidos, não sendo ela mesma capaz de garantir a segurança dos cidadãos.
Sabendo que o polícia não é um robô, cabe ao Estado dar segurança tanto a sociedade através da força de lei e ordem e aos policias dada a natureza do seu trabalho.
A causa da criminalidade no país não deve só ser vista do ponto de vista da polícia. A criminalidade tem também suas causas nas condições sociais e económicas a que o povo moçambicano está votado. Dai que tanto as academias como os outros centros de pesquisa precisam dar seu contributo no estudo sobre as causas dos crimes e propor soluções para sua redução.
A desigualdade social, a injustiça, a falta de oportunidades, a miséria e as discriminações de varia ordem, podem ser de alguma forma causas directas do crescimento da criminalidade nas Cidades de Maputo e Matola.
O descontentamento de certas alas na corporação, vinganças pessoais por actos violentos sofridos, necessidade de intimidar e desencorajar a policia no seu trabalho de combate ao crime, podem ser causas directas de crimes contra policiais.
Importa reconhecer urgentemente que estamos perante uma situação de manifesta gravidade, na medida em que o crime e os criminosos actuam no total descontrole da policia e das autoridades. Tem a ousadia de assaltar bancos, assaltar estabelecimentos comerciais, maltratar cidadãos e ate matar policias, em vias públicas, sem que ninguém se importe e a supressa dos policiais.
Os bandidos surpreendem a polícia, os bandidos fazem a agenda da polícia e antes que os próprios policias entendam o que está a acontecer as informações já estão a circular por toda a parte e aqueles já sabem quem está escalado, em que viatura e que tipo de operação será desencadeada.
Enquanto isso, a nossa força policial vai passeando a sua classe, aproveitando-se do corporativismo, encoberta os maus policias, tortura os cidadão, persegue e muitas vezes executa sumariamente.
Por isso propomos as seguintes medidas para o melhoramento da nossa polícia e para que a garantia da segurança pública, tranquilidade e ordem sejam uma realidade:

Adopção de uma política de segurança pública. Que essa política, para alem de ser participativa, deve ser resultado de uma estratégia de reformas no sector policial e no próprio Ministério do Interior;
Garantir que o nível de vida dos moçambicanos seja melhorado a medida em que se propaga o desenvolvimento económico do país. É necessário que os direitos sociais, económicos e culturais sejam garantidos. Pois, as pessoas vitimas das desigualdades sociais e injustiças económicas, permanentemente espezinhadas pelo poder, não são capazes de identificar a validade da moral, da ética, e do respeito às leis em suas vidas – já que, mesmo que a tudo isso observem, e em grande medida, não percebem reconhecimento ou compensação por parte da sociedade;
Definir áreas de prioridade absoluta tanto na corporação como no combate ao crime e alocar todo tipo de recursos para que os objectivos sejam alcançados plenamente;
Definir responsabilidades de cada brigada, equipe, comando ou agente, no sentido de garantir maior efectividade e também a responsabilização em casos necessários;
Apreensão de armas de fogo e rastreamento da sua movimentação. Afinal a arma em si não é tão importante mesmo depois de apreendida, quanto o curso que ela toma desde o começo até chegar as mãos dos criminosos;
Garantir segurança e assistência psico social ao polícia, dado que é ele quem cuida dos dramas da sociedade e acaba tendo seus próprios dramas que carecem do cuidado especializado cedido pelo Estado;
Não permitir que a diferença salarial do último polícia seja tão exorbitante, ou centenas de vezes que do primeiro. A injustiça salarial pode ser uma das causas para que os agentes do Estado colaborem com o crime;
Criar um programa de selecção de agentes policiais cada vez mais fortalecido sabendo que a policia é também uma das profissões perseguidas tanto por falhados como por tarados, psicopatas e obcecados pelo poder de decidir a situação dos outros;
Garantir a continuidade da formação e incorporar no currículo da formação dos policias temáticas de Direitos Humanos. Incutir no policia que ele é também um defensor de Direitos Humanos.
Transformar a ACIPOL em realmente uma Academia de Polícia e não numa escola política ou faculdade de letras e ciências sociais. Para que dela possam sair agentes capazes de trazer subsídios ao policiamento e ao combate ao crime.
A nossa polícia precisa de auto estima. Se o policia é também um cidadão é no cidadão que ele deve se inspirar. Não existe uma sociedade civil e outra sociedade dos policias. A sociedade deve respeitar o policia e não teme-lo. Havendo essa mentalidade e adopção de comportamentos tendentes a engrandecer esta filosofia, teremos uma policia acreditada pelos cidadãos e que com ela colabora no combate ao crime. Teríamos deste modo uma sociedade onde a criminalidade é reduzida.