sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Sismos sociais também nos Camarões


Não foi só no Quénia, no Chade, em Moçambique e no Burkina Faso, por exemplo: foi e é, também, nos Camarões, onde violentos protestos sacudiram esta semana a capital dos Camarões, Yaoundé. Barricadas foram erguidas, os jovens lutaram com a polícia no porto. Enquanto o presidente Paul Bya afirma que se trata de uma manobra da oposição para o depôr, a oposição diz que as causas das revoltas residem nos preços da comida e do combustível.
veja no blog do Professor Carlos Serra

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Qual é o crime?

Quando se fala de exclusão social em Moçambique, de discriminação, de perseguição de membros dos Partidos da oposição para uns isso não passa de uma ''ladaínha'' dos mesmos para desgastar o Partido no Poder.

A Questão Sócio Económica em Moçambique


Sobre a Abordagem e o Diálogo

Moçambique é um dos países mais pobres de África e do mundo, mesmo assim é preciso ressaltar que o país também consta da lista dos que estão em franco crescimento económico, o que lhe rende muitos louvores, mais credibilidade, mais apoios e investimentos.
Apesar do tal crescimento económico nacional mostrar, em termos percentuais, avanços significativos, o maior desafio ainda reside na capacidade de transformar esses ganhos em benefícios para os cidadãos. Quando falo em cidadãos gostaria de ressaltar que me refiro maioritariamente aos que moram no campo, o campo que alberga cerca de 70% de toda população nacional.

Mas os problemas sócio económicos moçambicano ou dos moçambicanos não se resumem nos tópicos que eventualmente possam ser discutidos, e até de forma sábia e científica pelos pensadores que nos últimos dias intervêm na nossa arena social.
Um factor positivo nisso tudo é que a consciência do diálogo e ou do debate está cada vez mais a crescer e cada cientista, dentro do seu ramo de saber, contribui com premissas e elementos que de certa forma ajudam a reflectir nas prováveis respostas ou soluções para os problemas que continuam a impedir o desenvolvimento humano no país.
Outro factor importante é que mesmo sendo visível em certas argumentações, conotações políticas ou cores partidárias, existe também uma grande inteligência dos leitores e comentadores em expurgar o que não é relevante para somente manter o útil e o essencial nas abordagens.

Penso entretanto que, muitos dos cientistas que discutem a questão social moçambicana, pela dificuldade que têm do contacto directo com a realidade, são reféns do que podem ouvir dizer, do que podem ver, ou do que podem ler em pequenos círculos. Dai a dificuldade de poderem dimensionar o palco dos problemas que se pretendem discutir.
O palco ou a arena onde os moçambicanos se digladiam dia a dia pela vida estende-se do Maputo ao cabo Delgado ou se quiserem de Cabo Delgado ao Maputo, o que quer dizer que ao longo do mesmo palco as realidades, por vezes divergem e as necessidades se diversificam, o que muitas vezes chama por respostas diferentes, mesmo que o problema seja idêntico.
Quem vive no Maputo e não tem o costume de ir ao interior dos distritos, fica na ilusão de que Moçambique é todo brilhante, onde todas as crianças cantam e vivem alegremente, todos moçambicanos tem acesso aos 5 ou 6 canais livres de televisão e que todos sabem o que é um t-bone, um sorvete, um cinema ou um chapa para ir e vir.

Quem vive em Macossa por exemplo, e não tem possibilidade de viajar para Chimoio, Tete ou até Maputo, fica na ilusão de que Moçambique todo não tem energia eléctrica, não tem celular, não tem chapa 100, não tem rádio, não tem restaurante e que todo mundo precisa de andar 20 ou 50 km para chegar ao hospital mais próximo, ou que acima de metade das crianças que nascem em Moçambique não têm a possibilidade de chegar aos 5 anos de idade.

Essa diversidade ou divergência, não relativisa nunca as necessidades básicas, descartando logo de imediato a possibilidade de alguém querer questionar o que são necessidades básicas e se elas são mesmas para pessoas que vivem em contextos sócio - económicos diferentes.
Na verdade, a fome é fome, a doença é doença, a dor é dor, a morte é morte, a lágrima é lágrima, o amor é amor, o ódio é ódio, a liberdade é liberdade, a prisão é prisão e a pessoa humana é sempre pessoa humana. Não interessa em que língua se fala sobre isso, não interessa onde se fala sobre isso, não interessa quem, ou como fala sobre isso, os conceitos absolutos têm o seu valor em si mesmos, independentemente do que o cientista pode oferecer ou pode criar.

Para alem da relatividade que a gente procura apagar quando falamos das necessidades básicas dos cidadãos, sendo essas o núcleo dos indicadores apresentados para avaliar e graduar o nível de vida no nosso país e nos outros do mundo, também está a questão relacionada com a capacidade de discutir os problemas e não as pessoas, as metodologias por si usadas, as suas crenças, as suas origens ou a sua orientação filosófica ou política.

O músico que admiro diz: o homem esfomeado é um homem zangado. E eu acrescento: ao homem esfomeado e zangado não se pede o rigor metodológico, ao homem esfomeado e zangado não se pede o aprumo cientifico, ao homem esfomeado e zangado não se exige serenidade e paciência, ao homem ou a mulher esfomeados dá-se-lhes, imediatamente, algo para comer ou meios para que encontrem a comida e matem a fome.
É importante que cada um se valorize com o seu trabalho através da valorização que dá ao trabalho dos outros. Por mais incrível que pareça, é o trabalho dos mais ridículos que torna os sábios cada vez mais sábios e evidentes. Para que conste, foram os sofistas que descobriram a Sócrates.

A capacidade de dialogo dos actores sociais passa necessariamente em compreender o problema. Quando o objecto está clarificado então as partes se entendem. O que eu percebo é que dos vários actores que discutem a questão social moçambicana, poucos realmente tem a imagem e a dimensão do problema que se pretende estudar e resolver.
Muito poucos é que conseguem enxergar o caminho que se pretende trilhar com vista ao desenvolvimento humano no nosso país. Uma pequena fracção tem a força, a ousadia e a coragem de assumirem que conhecem o problema, conhecem o caminho, conhecem o fim e aceitam o desafio. Sim, desafio porque a maioria é jovem e não tem certeza do futuro, já que em Moçambique tudo é obvio.

Realmente é tudo tão obvio no nosso país que é quase do consenso comum que ao Estado, ao mesmo tempo que não se deve responsabilizar pelas políticas públicas inclusivas e participativas, também não cabe responder as necessidades básicas dos cidadãos.
Para finalizar, já que o trabalho de muitos é fabricar ideias e defender a razão, deixo ficar a realidade do pai que respondeu ao filho filósofo que: “filho o primeiro frango é meu, o segundo é da tua mãe e esse terceiro ficará para ti”. Afinal o filho filósofo na mesa de jantar com dois frangos assados disse o seguinte aos pais: “sabe pai, em filosofia esses dois frangos podem ser três”.
Obrigado

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Custo de Vida: do Baixo Poder de Aquisição aos Protestos Populares

Palestra Proferida na Liga dos Direitos Humanos
A Cidade de Maputo, foi no dia 5 de Fevereiro fortemente abalada por uma onda de manifestações que por momentos paralisaram quase tudo que é essencial para o funcionamento normal da máquina administrativa e não só.
É que, tais manifestações que também produziram efeitos na Matola e tiveram réplicas em alguns pontos da província de Gaza visavam maioritariamente protestar contra súbita subida do preço dos chapas nas viagens que custavam 5Mt e 7.5Mt e passariam a custar 7.5Mt e 10Mt respectivamente.

Tal subida do preço dos chapas, chapas esses que constituem por sinal, a maior rede de serviços de transportes, acontece no mês de Fevereiro, curiosamente depois da subida do preço dos combustíveis, do pão e de outros produtos de consumo básico.
O mais agravante, é que, para alem dos cidadãos ainda não se refazerem dos gastos durante a quadra festiva do Natal e do Ano novo os salários mínimos ainda não estão reajustados.
Foi visível entre os manifestantes uma grande aderência de mulheres, jovens e crianças, embora homens adultos se fizessem presente acompanhando tudo de perto e agindo cautelosamente quando necessário.

A mídia esteve por perto, reportou uma boa parte das manifestações, das barricadas e da acção repressiva da polícia. Contudo, dias depois, o MISA e o CIP emitiram um comunicado comum, criticando a intromissão do poder político na actividade normal dos meios de comunicação social.
A Liga dos Direitos Humanos foi também vítima dessa interferência quando em pleno programa Televisivo este foi imediatamente interrompido. O motivo poderia ser eventualmente a questão da tortura e baleamento de cidadãos, para alem da contraposição que a Liga apresentou sobre o uso de armas de fogo.
É claro que as manifestações caracterizaram-se por uma onda de violência, o que desde o primeiro dia a Liga dos Direitos Humanos condenou, tanto a violência perpetrada pelos manifestantes bem como a violência perpetrada pelos agentes da Lei e Ordem. No nosso entender, nada justifica a violência.

Por conta dessa violência, num diagnostico feito pelo Hospital Central do Maputo, excluindo outros organismos hospitalares que também socorreram as vítimas, 93 feridos deram entrada no HCM. 58 apresentavam ferimentos provocadas por balas de fogo no dia 5 de Fevereiro e 26 no dia 6. Houve também 18 vítimas de intoxicação, 17 de agressões físicas, 15 de queda e 17 não especificados. Em termos de idades, as vítimas tinham entre 5 a 72 anos de idade.
Dos casos de baleamentos acontecidos entre dia 5 e 6 de Fevereiro, a Liga dos Direitos Humanos recebeu 6, sendo que alguns foram devidamente reportados pelo médico legista do Hospital Central de Maputo.

Mas afinal de contas qual foi a causa fundamental das Manifestações?
Algumas correntes que analisaram a questão culparam uma certa mão externa, uma mão invisível, ou mão estranha como sendo a causa promotora da manifestações, com vista a desenstabilizar o bom curso das coisas no país.
As mesmas correntes chegaram a afirmar que a tal mão externa instrumentalizou crianças para atingir seus objectivos.
Longe de estar certa, esta corrente pretende desviar a atenção do assunto e concentrar a discussão em questões periféricas. Aquela posição quererá com certeza deixar transparecer que o povo moçambicano não tem capacidade para por si levantar-se e reclamar os seus direitos.
Outras correntes, também suportadas pela liga Moçambicana dos direitos Humanos e pela Igreja Católica, advogam que o elevado custo de vida e o fraco poder aquisitivo dos cidadãos está na origem das manifestações, sendo por tanto o aumento dos preços dos chapas o ponto mais alto do maior problema da injustiça social e intolerância económica.
A pobreza em Moçambique, atinge cerca de 70% de toda a população, uma maioria dessa percentagem vive nas zonas rurais desprovidas de todos os serviços básicos necessários de que necessitam.

Quando falarmos da injustiça social e da intolerância económica precisamos de certa forma diferenciar as carências dos pobres que moram nas zonas urbanas ou suburbanos dos que moram nas zonas rurais. Enquanto que nos lugares chamados por cidades e vilas para alem da carência precisam suportar altos custos em:
Transporte, Educação: uniforme, material, transporte, taxas de exame, Habitação, que na sua maioria é arrendada e custos com água e luz. No pagamento da luz também suportam a taxa de rádio e difusão e lixo; assistência médica e medicamentosa, suborno a polícia e fiscais, entre outros.

Os pobres que moram nas zonas rurais, na sua maioria dedicam-se a agricultura de subsistência, a pesca, a caça ou ao artesanato e as suas carências baseia-se essencialmente na falta de serviços, como escolas, assistência médica, altos riscos de saúde, para alem de longas distâncias para fontes de água, ou outro serviço básico. Em muitos locais nas zonas rurais nem se fala de transportes de passageiros.
Políticas públicas que não são inclusivas nem participativas, tentam responder as necessidades de todos os pobres da mesma maneira, sem reconhecer as diferenças das populações rurais e urbanas e sem se preocupar com o local onde vivem e trabalham essas pessoas.
Falar de políticas públicas é falar de respostas concretas para os maiores problemas da população, onde ressaltam os transportes, a educação, a saúde, a justiça, o emprego, a habitação e outros.

Foi por isso que num certo momento chegamos a juntar, à manifestação de Maputo, quanto às suas causas, as manifestações de Chimoio e Beira. Nestes dois últimos casos as multidões se manifestaram e criaram quase o mesmo tipo de distúrbios do dia 5 Fevereiro para linchar malfeitores supostamente protegidos pela polícia.
Embora a causa primária dos linchamentos é a falta de confiança pelo trabalho da polícia, é preciso notar que o alto nível do custo de vida e a falta de oportunidades para milhares de jovens desempregados os conduz a delinquência ou a criminalidade. Criminalidade essa que não é devidamente controlada pela polícia, que falha com a segurança pública e nem devidamente punida pelo aparelho da administração da justiça que também falha na sua missão.
Por força da Constituição da República (no seu artigo 51 garante o direito de reunião e manifestação nos termos da lei), os cidadãos tem o direito de se manifestar sempre que para tal haja justificativa. É, contudo, importante notar que tal manifestação não deve ser feita com recurso a armas nem com violência. Pela Lei, percebe-se também que o Estado pode interferir na manifestação a fim de impedir actos ilegais ou de vandalismo, contanto que uso da força recorrida pelas autoridades seja proporcional a usada pelos manifestantes.

Em Conclusão
Não adianta esconder o problema do custo de vida e da fraca capacidade aquisitiva dos cidadãos sob o pano do preço dos combustíveis. É verdade que o problema dos combustíveis acaba mexendo com todos outros preços, mas não se transforma em si na causa última do problema.
A manifestação é um direito fundamental dos cidadãos, não sendo por acaso que tem um tratamento constitucional. Não é pois de um Estado de direito, mesmo que tal manifestação se faça acompanhar de violência, que a força repressiva do Estado se ache no poder de disparar intencionalmente contra cidadãos para matar. A vida e a integridade física são valores que devem a todo custo ser salvaguardados, sendo que a resposta policial a actos violentos deve ser sempre proporcional a aplicada pelos particulares.
Tendo sido confirmado o facto dos agentes policiais usarem munições de chumbo para acalmar os ânimos dos manifestantes, o que na verdade foi publicamente negado pelo comando Geral da PRM, é inteligente que a corporação apareça publicamente acetado o facto e pedindo desculpas às vitimas e seus familiares.
Mais do que subsidiar os combustíveis para os chapeiros, o Estado precisa criar políticas públicas para transportes públicos na medida em que essa é uma das funções e obrigatoriedade do Estado. Na mesma linha, para reduzir a miséria e a carência da população é necessário que estratégias integradas sejam elaboradas no sentido de gerar mais oportunidades de emprego, de saúde, de habitação e de justiça.
No nosso entender, o 5 de Fevereiro significa um marco importante na construção de um Estado de Direito e Justiça Social. Uma resposta para essa data que foi aplaudida com actos semelhantes em Gaza, Sofala e Manica, deve ser integrada aos mais variados níveis governamentais, da sociedade civil e outros parceiros de desenvolvimento, para que o pior seja evitado, contanto que caminhamos para uma época politicamente sensível quando se avizinha uma série de eleições no país.
Obrigado

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Solidariedade com Belarus

No dia 23 de Fevereiro, em Belarus morreu a Iryna Kazulina, esposa do prisioneiro da consciência, prisioneiro político do regime ditatorial do país, Alyaksandr Kazulin.
O corpo da Iryna Kazulina será sepultado no dia 27 de Fevereiro, o velório público terá lugar no Igreja vermelha (cidade de Mensk), entre 20h00 do dia 26.II e 12h00 do dia 27.II

A não esquecer que no dia 25 de Março de 2008, a Belarus irá celebrar 90º aniversário da proclamação da Independência da República Popular de Belarus, acção que tem toda a nossa solidariedade e apoio moral.

Mais informação sobre a Belarus:
http://www.charter97.org/en/news
http://www.radabnr.org/
http://www.zbsb.org/eng/index.shtml

Carta Aberta ao Ministro da Saúde



Senhor Ministro, Excelência

Esta é a primeira vez que directamente me dirijo a si, por meio de uma carta aberta, pois creio que o senhor tirará tempo para analisar o que aqui pretendo fazer chegar.
Escrevo-lhe porque acredito na sua capacidade pessoal e técnica no Ministério que dirige. Para mim, o senhor é um dos poucos ministros que está no lugar certo.
Escrevo-lhe também para parabeniza-lo, sabendo que o senhor está incansavelmente empenhado a reformar o ministério que dirige dada a importância que tem para o desenvolvimento deste país.
O que quero dizer não é sobre o Ministério entanto que tal, mas sobre o Hospital Central de Maputo, que ao mesmo tempo é um espelho bem claro do vosso trabalho e das vossas intenções.

Vou começar por colocar duas situações:

Primeiro:

Na última semana de Janeiro tive que levar um amigo ao hospital central, concretamente ao Posto de Socorros, já que ele tinha sofrido uma agressão física e estava a sangrar na testa. Ao entrarmos, depois de abrir a ficha e antes de chegarmos a caixa, onde devíamos fazer um pagamento de 150 Meticais, fomos interceptados por um enfermeiro que segurou o braço do meu amigo e fez-me parar.
Insisti com ele que ainda não tínhamos feito o pagamento, mas ele pediu que me calasse e ficasse a espera. Parei e o meu amigo continuou com o tal enfermeiro. Percebi o que eventualmente estava a acontecer, então mandei um sms ao meu amigo informando que estava a suspeitar tratar-se de um truque para cobrança ilícita e, que se disso se tratasse ele não pagasse, ao menos que dessem recibo.
Na verdade era disso que se tratava e o enfermeiro insistiu que ele deveria fazer o pagamento senão teria que ficar a espera e não receberia o tratamento mais apropriado. O meu amigo fez o pagamento e cerca de 20 minutos depois ele estava despachado.
Lamentei o facto, mas naquele momento nada podia fazer, conduzi o meu amigo a casa, pensando comigo porquê as reformas que o Senhor Ministro pretende dinamizar apresentam esse tipo de falhas.

Segundo:

Uma semana depois, tive que levar uma colega à Clinica Especial, ela torceu a perna no batelão vindo da Catembe onde tínhamos um encontro sobre Direitos Humanos. A minha colega é europeia e tinha um seguro de saúde, fomos a clínica e em uma hora estava tudo pronto. Só que foi necessário receber uma vacina contra tétano, eu tive que dirigir-me a farmácia para comprar tal vacina.
Coincidentemente, estava na farmácia o jovem que havia feito o Raio X da minha colega na Clínica Especial, ele acabava de largar e pretendia comprar Pó (lauriderme penso eu) para seu filho recém-nascido. Tal pó custava cerca de 170 Meticais e na hora o jovem só tinha 130 Meticais.

O jovem implorava ao farmacêutico que lhe fizesse um favor e aceitasse receber o remanescente no dia seguinte. Dizia ele que havia trabalhado o dia todo e que não teve possibilidades de sair para procurar dinheiro ou ir comprar o mesmo medicamento em lugares mais baratos.
Fiquei escutando a conversa por cerca de 15 minutos, mas o farmacêutico foi forte e disse que nada podia fazer. Perguntei-lhe porque é que era assim? Trabalhadores não terem algum beneficio, mesmo que isso significasse descontos no salário? A resposta foi: “olha senhor, eu também trabalho aqui na Clínica Especial, mas quando estou doente ou quando meu filho está doente não conseguimos vir até aqui. Nunca fui tratado aqui.”
Olhei para a cara do jovem técnico, percebi seu desespero e ofereci-lhe duzentos Meticais. Ele comprou o Pó para o seu filho e reteve os trocos.
Peguei na minha colega e conduzi-a ao hotel. Durante o percurso e até a minha casa, pensei nos dois episódios que aconteceram no mesmo hospital e em dias diferentes, todos com trabalhadores da saúde e coloquei algumas hipóteses.
Pareceu-me que algumas cobranças ilícitas têm em vista satisfazer necessidades básicas dos enfermeiros, como por exemplo, comprar medicamentos para si.

Senhor Ministro,

Não quero justificar práticas ilícitas dos trabalhadores de saúde, mas quero dizer que elas existem e que as suas causas devem ser muito bem estudadas para solucioná-las. Já imaginou o que é fazer cobranças ilícitas a um doente? Isso é aproveitar-se do estado de necessidade das pessoas e até certo ponto ameaçá-las ou chantagea-las pois se não faz tal pagamento pode correr riscos.

Mas também, já imaginou Senhor Ministro, um enfermeiro trabalhar num hospital e não ter condições de levar seu filho para lá? Vender medicamentos e não poder ter medicamentos para si e sua família. Imagina a situação daquele jovem técnico de Raio X que queria Pó para seu filho e simplesmente não conseguiu, nem pelos seus meios nem pelo apoio do hospital e teve que se beneficiar da boa vontade dos utentes.

Senhor Ministro,

Não posso continuar a fazer perguntas, pois sei que V.Excia já percebeu o cerne da questão que apresento. Gostaria somente de afirmar em jeito de fecho que, mais do que criar boas condições para os doentes, é preciso criar excelentes condições para os funcionários da saúde, para que estes, consequentemente, tratem bem aos utentes do hospital.

Muito obrigado Senhor Ministro, por tirar tempo e ler esta carta!

Sempre

Custódio Duma

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Morrem Mais dois inocentes

Fonte: Jornal Noticias de Moçambique (2008, Fevereiro 25)
Polícia mata acidentalmente

UM cidadão perdeu a vida e outro ficou ferido, na noite do último sábado, ao serem alvejados acidentalmente por tiros disparados pela Polícia da República de Moçambique (PRM), que perseguiam um motociclista que não respeitou a ordem de interromper a marcha quando assim lhe foi ordenado.

Trata-se de Azevedo Castigo e João Mussengue, ambos estudantes da Universidade Pedagógica que foram atingidos quando circulavam ao longo da Avenida Eduardo Mondlane.
De acordo com o porta-voz do Comando da PRM, na cidade de Maputo, Arnaldo Chefo, tudo começou quando uma equipa de patrulha mandou parar um indivíduo que conduzia uma moto BMW. Este não teria respeitado o sinal dos agentes e, de seguida, encetou a fuga.

Depois de manobras e gincanas pelas avenidas da cidade do motociclista, para ludibriar a Polícia, ele acabaria entrando para a “Eduardo Mondlane”, local onde um dos agentes que fazia parte da equipa de patrulha abriu fogo para obrigá-lo a parar.
Foi nesse exercício que uma das balas feriu o fugitivo na perna, o que possibilitou a sua captura e posterior detenção, depois passar pelo Hospital Central de Maputo onde foi receber os primeiros cuidados médicos.

Chefo disse que foi nesse entretanto que dos disparos efectuados parte dos projécteis acabariam atingindo mortalmente e ferir as vítimas, que faziam parte de um grupo de quatro pessoas que caminhava ao longo da estrada.

O porta-voz da PRM, na capital, afirmou que as autoridades policiais já estão a desdobrar-se com todo o conjunto de medidas para atender a um caso desta natureza com toda a delicadeza e responsabilidade que ele encerra.

Com relação aos agentes envolvidos neste caso, o nosso interlocutor afirmou que está em curso um processo de audição para poder se apurar as responsabilidades de modo a que possam responder por aquilo que pode estar associado a uma situação de excessos.
Para além deste incidente, Arnaldo Chefo referiu que as autoridades policiais registaram a ocorrência de quatro roubos de viaturas, uma das quais foi recuperada ainda no mesmo fim-de-semana.

Nas estradas da cidade de Maputo ocorreram sete acidentes de viação, dos quais três atropelamentos a peões e quatro choques entre viaturas, que tiveram como consequências três feridos graves e diversos danos materiais.
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Recebi de Betuel Canhanga

Eu tenho dificuldades em perceber a frieza e compaixao da policia que vezes sem conta aparece a dizer que está a tomar "todas medidas" e com toda delicadeza pra tratar desse assunto, nao sei que delicadeza se utiliza para tratar de um assunto de morte injusta e de certa forma negligente de cidadaos!!! Reconeço em parte minha inocencia e falta de capacidade em entender essas coisas, é que ao meu ver é arrepiante a quantidade de individuos que perdem a vida em situaçoes de balas peridas! Pra mim, nao sao despezas de funeral, e muito menos uma possivel indeminizaçao que repoem as marcas da vida de alguem, que apagam ou diminuem a dor!!! Nada disso! Será que nao ha mesmo como pararmos com esses numeros de balas perdidas e mortes aparecidas?

(As vezes me parece que ha mais balas se perdendo do que pneus se queimando!!! ), acho que deviamos encetar uma luta contra esses dois males, sinceramente falando, chega de amputarmos os sonhos de nossos camaradas... a vida é sagrada!

Aparente Greve dos Chapeiros

Em Maputo e Matola
Hoje, a cidade de Maputo acordou com um alerta de eventual greve dos chapeiros.
Na verdade parece que a solução encontrada pelo Governo para solucionar o problema que se levantou dos preços dos chapas não é de fácil exequibilidade.
O ministro dos transportes, aparentemente desgastado falou através da Rádio Moçambique aos chapeiros para que antes de tomarem acçoes desabonatórias recorressem às suas respectivas Associaçãoes para que se interem das últimas recomendações.
Estamos quanto a mim, numa situação em que o dialogo entre o governo e os chapeiros ainda não está claro.
Parece que os chapeiros não estão muito felizes com os critérios apontados como solução para o preço dos combustíveis.
A ser assim, os cidadãos é que vão pagar a conta, já que hoje, muitos não puderam se apresentar ns seus postso de trabalho.
Não entendo bem de economia, mas para resolver este problema, o Ministro dos Transportes não precisa apresentar-se nervoso, precisa somente repensar a política dos trasportes públicos. Se o Estado assumir esta função como sua e criar condições para transportar os cidadãos, me parece que os problemas serão outros.
Pois, me parece ser uma tarefa muito dura subsidiar combustíveis para os transportadores, numa situacão em que os preços de combustíveis não são estáveis, nem os chapeiros e outros trasportadores públicos tem contabilidade organizada ou licenciamento em dia.
É um assunto ainda por discutir...
Bom dia

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Fogo na Cidade de Chimoio



A Cidade de Chimoio, capital da provincial de Manica, acordou de baixo de fogo cruzado.
A policia usando armas de fogo tenta impedir as multidões de manifestantes desgastadas com a acção dos criminosos.
Embora os cidadãos tenham elas mesmo neutralizado os criminosos e conduzindo-os as autoridades, insistiram que a polícia devia matá-los.

Mais uma vez o crime está no cerne da questão.
Interessante que os cidadãos não lincharam os supostos criminosos. Já que a polícia não o fez, não tardará a chegar casos de linchamentos na Cidade de Chimoio.

Sobre esse assunto eu e o Prof. Carlos Serra, falamos no programa opinião pública de ontem na STV, tendo afirmado no jornal da Noite que a onda de linchamentos não vai parar se uma resposta coordenada não ser dada.

Ainda no meu blog, tentei ligar os linchamentos e as manifestações. Melhor prova que a situação de Chimoio não encontraria.

Sempre

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Linchamentos, Manifestações e o Custo de Vida


Vejo os linchamentos na cidade de Maputo e Beira, bem como as manifestações violentas do dia 5 de Fevereiro em Maputo, como problemas originados pela mesma causa: a ausência do Estado na vida das pessoas.
É claro que o Estado deveria chegar até as pessoas, a partir de políticas públicas participativas e inclusivas. Para que elas sejam participativas e inclusivas é necessário que a sua definição seja o mais aprofundado possível, passando necessariamente pela integração e actuação conjunta dos vários ministérios e sectores da vida económica e social.
Em Maputo, Matola e Beira, os linchamentos acontecem devido a má qualidade dos serviços da administração de justiça. A polícia é deficiente no seu trabalho e o Ministério Público é quase desinteressado nos vários casos apresentados. O tribunal, para alem de ser moroso exige do cidadão um esforço que em muitas situações este não é capaz de fazer na hora.
Por várias vezes, pessoas que foram entregues as autoridades competentes por populares, horas ou dias depois estavam na comunidade a cometerem os mesmos crimes. Por várias vezes, a população tentou lutar com procuradores porque estes não viam crimes onde a população tinha certeza de ter encontrado em flagrante delito.
Perto do fim do ano de 2007, a população de Gondola em Manica, barricou as estradas, quase que assaltava a esquadra e linchava o procurador local porque estes se mostraram ineficientes no garantir a segurança pública e a justiça.
Tratou-se de um caso que muitos chamaram de isolado. Para alem de ter sido reportado pela mídia nada mais foi feito para perceber as causas do problema.
A cidade da Beira apresenta desde o último semestre de 2007 uma tendência de aumento dos casos de linchamento, um fenómeno que é visto com normalidade e não com seriedade. A população desta cidade chegou a manifestar-se na esquadra exigindo pessoas que deviam ser linchadas.
Em todos os casos, incluindo os que não foram citados, é evidente o olhar cúmplice do Estado que acredita tratarem-se de situações isoladas e que com alguma repreensão ou com o passar dos dias as populações se esquecerão e se envolverão em outros problemas.
Esse olhar cúmplice, agrava a situação quando mesmo com uma oferta quase inexistente de serviços públicos ao cidadão, o custo de vida é demasiadamente agravado e exige-se impiedosamente que pessoas vivendo abaixo dos níveis de pobreza possam ser capazes do nada assegurarem o básico para sua sobrevivência.
A revolta popular do dia 5 de Fevereiro, teve como causa o elevadíssimo custo de vida e a ausência de serviços públicos para satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos. A imagem que nos é mostrada é de um povo que para alem de ser explorado é punido com a falta do básico que necessita para sobreviver.
Enquanto isso, os criminosos andam a solta e saqueiam o pouco que as pessoas têm sob o olhar tímido das autoridades. As próprias autoridades, sempre que podem, dedicam-se a saquear o cidadão, principalmente os que se encontram nas estradas, como fiscais e polícias. Os professores e enfermeiros, bem como os outros funcionários públicos que no seu dia a dia deviam dedicar-se ao cidadão, simplesmente o saqueiam.
O cidadão fica numa situação de quem está a fugir de um leão e encontra um urso ou de um urso e encontra um leão. Quer dizer que de todas as maneiras tem a sua situação agravada e colocada no mais alto perigo.
Não vejo o fenómeno dos linchamentos e o da revolta social como problemas isolados. São sim problemas com motivações na mesma causa e visam o mesmo fim.
Um Estado que recebe reclamações de todos os lados deve rever suas posições. Reclamações de funcionários, reclamações de produtores, reclamações de vendedores, reclamações de pais, reclamações de filhos, reclamações de todos que de alguma forma esperariam uma resposta a centenas de perguntas que são diariamente formuladas.
O alto custo de vida e a ausência de políticas públicas retiram por inteiro todas as oportunidades que os cidadãos teriam de se realizar como pessoas. Retiram dos cidadãos o sonho de ter sucesso por vias licitas. A falta de oportunidades está na origem dos vários crimes diariamente cometidos aos nossos olhos.
Tenho dito em muitas situações que o problema da criminalidade no nosso país reside nos problemas sociais e económicos que não conseguimos resolver. Apetrechar a polícia com os mais altos equipamentos de choque só fará crescer o índice de execuções sumárias e torturas, como aconteceu durante as manifestações, mas o problema não estará resolvido.
Julgar rapidamente todos os processos, sem isso constituir uma política pública de resposta aos problemas sociais só trará problemas de superlotação nas cadeias como se nota na cadeia Civil e na Machava. A superlotação das prisões traz consequências gravíssimas aos reclusos e repercussões drásticas aos cidadãos.
Não estou a tentar trazer aqui uma imagem de um Estado que deve ser perfeito, penso que não existe em lugar nenhum do mundo. Mas Estados que respeitem os direitos fundamentais dos cidadãos e se preocupam em garantir o mínimo às pessoas, existem aos montes e é essa imagem que pretende aqui trazer.
Agora, o Estado moçambicano, aprendeu a ter medo dos cidadãos, agora desconfia dos seus passos e daqui para frente se preparará para com força de choque e bloqueio responder imediatamente qualquer sinal de revolta, reclamação ou manifestação.
Procura-se vender uma imagem perfeita de Moçambique a custa do sangue e sacrifício das pessoas. Isso é que causa revolta nas pessoas. Procura-se esconder a verdadeira realidade deste país para manter os favores das instituições de Bretton Woods em beneficio de alguns. Isso é que causa revoltas ao cidadão.
Penso que, se o curso da política moçambicana não muda de estratégia, estaremos a caminhar para uma situação de descontrole total em relação ao sentimento do povo. estaremos a tornar este povo cada vez mais imprevisível e disposto a alinhar para e contra tudo que der e vier.
Está provado que não houve mão externa nas manifestações que quase paralisaram o Estado. Na hipótese de se levantarem mãos, líderes e grupos organizados os males serão imensuráveis e isso só será possível se o governo do dia se limitar a responder situações pontuais como reduzir preços de combustíveis para os chapeiros e não olhar para a generalidade do problema.
Todos os povos tem o direito de revolta ao governo que se mostre tirano, mesmo que essa revolta ou manifestação seja considerada ilegal. Ao mesmo será legitimada com a sua finalidade de garantir os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e as respectivas garantias.
Não se engana ao povo, mesmo que este seja maioritariamente analfabeto. Não se mente ao povo, mesmo que este não entenda de políticas e estratégias. Pode adiar-se uma situação mas não será sempre assim.
Para bom entendedor, os linchamentos e as manifestações já são um prenuncio de uma mudança de atitude na mentalidade do povo que é açoitado pelo altíssimo custo de vida.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

JOÃO PAULO


A Voz que se Imortalizou

Acompanhei com muita dor e tristeza a morte de João Paulo, o verdadeiro Blues Man Moçambicano, o JP ou simplesmente o Real McCoy como os amigos mais íntimos o chamavam.
Não pude resistir ao choque nem a dor que momentaneamente tomou conta de mim. Como verdadeiro amante e coleccionador de Blues, eu adoro sem dúvidas nem hipocrisia toda a vida de João Paulo.
Amo o seu estilo, a sua voz, a sua identidade e tudo que ele acreditava. João Paulo é um ídolo para mim e isso nunca escondi a ninguém.
Alguém me falou há dias que tinha sentido a ausência do João Paulo no Goa. Sim, esse era o seu lugar preferido e ele até perdoava as pessoas que achavam ou falavam mal desse seu gosto pelo Goa, pois para ele, aquele não era um lugar qualquer.
Para João Paulo, o Goa não era um simples bar, o Goa era o seu Bourbon Street. Ali ele fazia a sua viagem pelo French Quarter em New Orlean e podia ouvir centenas de bandas de Blues a tocar ou ensaiar para fazer delirar os turistas que não param de chegar e apreciar.
Bourbon Street quase que não tem nada dos Estados Unidos. Uma rua sem grande tráfico, sem prédios altos e sem muita agitação. Tudo é paz. Esse era o lugar de João Paulo, o Goa, o seu Bourbon Street que contrasta bastante com a Avenida Eduardo Mondlane.
New Orlean situa-se estrategicamente ao longo do delta do Mississipi. Rio e lugar que João Paulo sempre mencionou quando subia ao palco. Lugar que não sei se conheceu mas amou, porque o Blues dali não é para os ouvintes, é para si, é para quem canta, um imperativo de vida.
João Paulo será para sempre lembrado pela voz ímpar com que se expressava. E quem pintar João Paulo colocará na sua mão um copo com whisky velho sem gelo. Se não fosse assim, João Paulo não seria um Blues Man.
Quem conhece a historia do Blues e conhece João Paulo fará menção de que o homem foi fiel a farda e que ao destino o homem não traiu. João Paulo viveu como mandam as regras do Blues que abraçou enquanto jovem, tendo se notabilizado nos Monstros, chegando a ser cabeça de cartaz em muitos lugares dentro e fora de Moçambique.
Lembro-me que no ano passado João Paulo afirmou em palco que em todos os anos de carreira nunca caiu no palco e que não gostava que o chamasse por JP porque tinha um nome completo e que por sinal tinha o apelido Macamo, xará do meu amigo que ele chamou de Papagaio.
Lembro-me ter encontrado o João Paulo na Catedral correndo ao palco com seu chinelo na mão. Lembro-me de ouvir João Paulo dizer que este país precisa de jovens corajosos e firmes nos seus ideais. João Paulo não se simpatizava com a cobardia.
João Paulo era um homem firme, não se esquecia das pessoas com quem falava, nem dos assuntos que tocava. Vivia sua vida como um homem honesto que acreditava no poder da arte que seguia e olhava para o Blues como a sua principal arma de batalha, assim também como a água que vigorava sua vida.
João Paulo foi um Blues Man revolucionário e sob esse ponto de vista influenciou minha vida de forma positiva.
Não sei se outra voz aparecerá para cobrir o espaço por ele deixado nos bares onde em noites de Blues nos encontrávamos. A verdade é que a sua voz não se vai apagar jamais e sempre beberemos um copo em memória do Moody Waters como eu o Macamo o chamávamos.

PAZ A SUA ALMA

DESCANSE EM PAZ IRMÃO!

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Ausência de Políticas Públicas e a Revolta Social


Sou da opinião que, quando os governantes falham com as políticas públicas os cidadãos tornam-se ingovernáveis e o caos toma conta da polis. Sou da opinião também de que sempre que um governo falha em responder as necessidades básicas dos cidadãos estes não se importam em vandalizar tudo que for possível.
O povo moçambicano foi sempre rotulado de um dos mais pacíficos na terra, ou seja, quase que não reclama de nada. Mas os acontecimentos de ontem, dia 5 de Fevereiro, justamente um dia depois do dia dos heróis nacionais veio a demonstrar que qualquer paciência tem limites.
Bem no final do ano passado o Presidente da República veio ao público sublinhar que o estado da Nação era bom. O mesmo discurso veio depois a ser sustentado pela Primeira Ministra que assegurou que o país está no bom caminho para atingir as Metas do Milénio.
O representante das Nações Unidas em Moçambique sublinhou a mesma fala. Disse em viva voz que o país é um exemplo e que a economia está a crescer de forma exemplar. Anteontem, o Presidente do Banco Mundial reforçou as três falas anteriores.
Enquanto isso, o Relatório da Agência das Nações Unidas para o Desenvolvimento, ilustra uma imagem debilitada de Moçambique. A Integridade Global, organização que monitora o desempenho dos Estados no lado da corrupção dá uma nota muito negativa ao governo de Guebuza. A Fundação Mo Ibrahimo, aquela que congratulou Chissano por boa governação, colocou Moçambique abaixo do Zimbabwe em termos de boa governação.
Há discurso muito diferentes sobre o mesmo aspecto. Pessoalmente tenho sido criticado por afirmar que não pode haver duas verdades para o mesmo facto. Talvez porque levo muito a sério a ideia de verdades absolutas. Não me interessam as verdades relativas.
Moçambique não pode estar a desenvolver-se e, a não desenvolver-se ao mesmo tempo. Não pode ter um franco crescimento económico e ao mesmo tempo ter um dos mais baixos índices de desenvolvimento humanos no mundo. Não pode ter uma governação exemplar tendo ao mesmo tempo índices muito altos de corrupção. Dos que discursam, há quem está a falar a verdade e ha quem está a mentir.
A minha percepção pessoal indica que este país é fraco em termos de políticas públicas. Para começar vou mexer o lado dos transportes. Que política tem o Estado para os transportes públicos? Nenhuma. Quem até hoje se preocupa com os passageiros são privados e não o Estado. Todos os dias, sob todos os riscos, vemos pessoas em pé nas paragens dos vulgos chapas a espera da boa vontade dos chapeiros. Enquanto isso os servidores públicos estão ausentes.
Que políticas públicas existem para a área dos combustíveis? Nenhuma. O Estado nem aventa a hipótese de subsidiar os combustíveis para facilitar a vida dos cidadãos. Cada dia os combustíveis sobem drasticamente e o último cidadão é que acarreta com os custos. Na verdade, os funcionários do Estado, os bem posicionados não pagam o combustível, é tudo pago pelos impostos dos cidadãos.
Que política públicas existem para o desemprego? Nenhuma. Embora o Estado seja o maior empregador, quantas pessoas realmente estão empregadas, e qual o universo dos que não estão. Acima de 60% da população potencialmente trabalhadora não tem emprego e sobrevive graças a biscatos.
Que políticas publicas existem para o salário mínimo. Nenhuma. O salário mínimo ainda não é calculado com base das necessidades básicas das pessoas. O valor é determinado numa mesa e passa a ser assim. Temos o salário mínimo mais baixo da África Austral e mesmo assim há quem afirma que estamos num bom caminho.
Poderia gastar toda a tinta a perguntar de políticas públicas, mas eu sei que elas não existem. Este país vive de improvisos, a maior parte das decisões tomadas são improvisadas e para remediar situações.
Quando uma boa parte dos manifestantes passou em frente do meu escritório, onde bateram em carros incluindo o meu, olhei para cada um deles e vi jovens. Vi crianças e adolescentes. Seres humanos moçambicanos desesperados.
Esses jovens caminhavam para nenhures, olhavam para o vazio e esperavam o nada. Gritavam palavras sem conteúdo e buscavam uma orientação para os seus actos. Mesmo tendo sofrido avultados danos materiais, vi no rosto daqueles concidadãos a imagem do desespero, da miséria e do desgaste.
Onde é que estavam os adultos? Onde é que estavam os mais velhos? E porque é que eram aqueles jovens? De ambos os sexos, todos revoltados? Revoltados contra o que? E contra quem?
Estão revoltados contra o Estado que não cria políticas públicas inclusivas. Os adultos e os velhos já perderam a sensibilidade da indignação. Estão conformados e querem manter o pouco que organizaram ao longo desses duros anos de vida.
Os jovens não. Eles não tem nada a perder, eles querem o seu espaço, querem o seu lugar.
Essa revolta não é só causada pela subida do preço do pão, do combustível e do preço do chapa. Isso só veio pôr combustível na fogueira. Isso só foi o cúmulo de toda a indignação guardada no coração.
Quando faltam políticas públicas participativas e inclusivas o povo tem direito de se revoltar. A revolta social é um direito fundamental, mesmo que a repreensão venha a ser excessiva. É o que acontece no lado das leis, todos têm o direito de não cumprir leis injustas.
Temos um governo que sobrevive graças a ignorância do povo. Temos um governo que se alimenta e se engorda com a mesquinhice da oposição. Temos uma oposição que se esqueceu da sua missão. Temos um país que sobrevive graças a sorte.
Temos intelectuais que não sabem discernir o norte e o sul. Temos um Estado típico, um Estado chamado de direito e mesmo assim sem império da lei nem separação de poderes. Como é que seria possível evitar a revolta social?
Estou convencido que o actual governo de Moçambique veio agravar o fardo dos cidadãos. Subiu o custo de vida mas não melhorou o poder aquisitivo das pessoas. Agravou a violação dos direitos humanos e fragilizou as garantias constitucionais. Impediu a separação de poderes e declarou guerra a Constituição da República.
Nessas condições nenhuma sociedade resiste sem dar a sua palavra. Uma multidão sem pão não precisa de líder. A fome já é um grande líder. Uma população empobrecida não precisa de propaganda. A própria pobreza já é um apelo a revolta.
Não há como impedir que isso aconteça no país enquanto continuamos numa governação mesquinha. O pior ainda está por vir: as próximas eleições terão uma aderência mínima, tal como nunca havia acontecido antes.
E ainda há quem diz que essas pessoas estão a imitar os kenianos, é falso? Esses manifestantes nem televisão tem para ver o que está a acontecer no mundo.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Manifestantes Bateram Vidro do Meu Carro

Os manifestantes que hoje deviam estar nas noticias do dia passaram pela Liga dos Direitos Humanos, bateram em dois carros, machucando a chaparia e danificando os vidros. Um dos carros é o meu! É carro pessoal.

Fiquei pensando: existe alguém que nao entende de políticas publicas, fez alguns cálculos, subiu preço de alguns produtos e serviços e por conta disso eu fiquei vítima.

Por conta disso tenho que comprar um novo vidro para o meu carro.

O povo não é louco. Isto é só um aviso e quem pensa que o que a gente escreve é só para sujar o governo do dia deve por a mao na consciencia e ver que tudo tem seu tempo.

Apesar dos danos que sofri, apoio os manifestantes, o custo de vida está demasiadamente alto!

Sempre

Custo de Vida: um dos pesos na Governação de Guebuza

Espero poder ter tempo para escrever algo mais detalhado e aprofundado sobre o assunto. Mas enquanto não posso faze-lo, deixo desde já a minha opiniao:

Tres anos de Governacao de Guebuza, cinco pesos podem ser indicados como agravos a situação dos moçambicanos:

1. Sistematica violação dos direitos humanos: inseguraça pública generalizada, execuções sumárias e tortura agudizadas pela polícia;

2. Aumento do custo de vida e reduçao da capacidade aqyisitiva: sobe o preço do pão, sobe o preço dos comustíveis, sobem os preços dos transportes e os salários não sobem;

3. Políticas Públicas desajustadas: maior interesse em obter relatórios satisfatorios em termos numéricos e estatísticos e quase nunca na prática, exemplo de alunos da sétima classe em Cuamba que nao sabem ler;

4. Forte atropelos a Constituição da República;

5. Capitulação no Combate a Corrupção.

Ainda sobre a FIR contra a Liberdade de Manifetação!!

Sobre o facto da Força de Intervenção Rápida enviada a impedir uma manifestação não violenta e cheia de paz, organizada pelos Camponeses na Manhiça, sobre o qual escrevi umas pequenas linhas no blog:
http://athiopia.blogspot.com/2008/01/atentado-liberdade-de-manifestao.html

veja o relato de alguem que esteve presente:
http://www.viacampesina.org/main_sp/index.php?option=com_content&task=view&id=441&Itemid=34

O link ao texto foi me enviado por um anónimo, a quem desde já agradeço!

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

8 Policias espancaram um estudante

Quanto Custa ter um Bilhete de Identidade? E um Cartão de Eleitor


Faz tempo que tento reflectir sobre este assunto, contudo, sempre que tento avançar, algo me manda procurar novos elementos. É que mais do que se tratar de um Bilhete de Identidade ou um Cartão de Eleitor, o assunto tem a ver com o exercício de cidadania.
O Bilhete de Identidade, é um documento nacional de identificação dos cidadãos. Para vários efeitos, não é possível realizar operações sem o Bilhete de Identidade. O Cartão de eleitor, é um documento que comprova que o cidadão está inscrito no Secretariado Técnico de Administração Eleitoral e por tanto, está apto para votar e ser votado.
Olhando para as funções e importância de cada um dos documentos, embora os dois visam o exercício de cidadania, é importante realçar que o Bilhete de Identidade tem maior importância para o próprio titular, enquanto que, em verdade, o Cartão de Eleitor é importante para os políticos.
Em Moçambique o voto é livre, ou seja, ninguém é obrigado a ir votar embora seja esse um dever cívico. Do mesmo jeito, ninguém é obrigado a ter um Cartão de Eleitor na medida em que o exercício da votação é um acto livre.
O contrário acontece com o Bilhete de Identidade. Este é um documento de posse obrigatória. Há inclusive casos de cidadãos que são detidos porque não se faziam acompanhar do seu Bilhete de Identidade. É claro que a obrigação não é expressa, mas as necessidades do dia a dia obrigam a ter esse documento.
Estranho é o facto do custo e tempo que se requer para obter cada um desses documentos. Quando se está próximo as eleições, o Estado, através de órgãos criados para o efeito, caso do STAE, Secretariado Técnico de Administração Eleitoral, oferece todas as condições aos cidadãos para que estes se registem e tenham seu cartão de eleitor. Todo o procedimento de recenseamento leva apenas minutos, quase nunca mais de 20 minutos. Sublinhe-se que para este cartão não há custos financeiros a suportar, senão os de ir e vir.
É claro que essas facilidades são realmente de saudar, o preocupaste é que as mesmas condições já não são criadas quando se trata de obter um Bilhete de Identidade.
Para que o cidadão obtenha o seu Bilhete de Identidade, deverá esperar pelo menos um ano inteiro. Para alem de maus serviços oferecidos pelos funcionários públicos nas direcções de identificação civil que muitas vezes confundem sua missão, é necessário que traga uma série de coisas, entre documentos, fotos, dinheiro entre outros.
Olhando para importância de um e de outro, penso que o Estado empenha-se menos onde devia empenhar-se mais, ou seja, o Estado devia criar condições necessárias para que os cidadãos moçambicanos obtenham o Bilhete de Identidade em menos tempo e com menor custo.
Considerando que em Moçambique há pais que não conseguem matricular seus filhos porque estes não possuem um Bilhete de Identidade, considerando que em Moçambique há camponeses que não conseguem abrir uma conta bancária porque não têm um Bilhete de Identidade, considerando que em Moçambique há jovens que são detidos porque não têm Bilhete de Identidade, considerando estes e outros exemplos que poderiam ser citados, é engraçado que neste país seja tão difícil obter um Bilhete de Identidade.
O Cartão de Eleitor, possibilita o cidadão a votar e a ser votado. Na maior parte das vezes possibilita-o mais a votar que a ser votado. Votar significa conceder um pouco da sua soberania a alguém que vai exercer o poder político. O povo, os cidadãos, são o poder constituinte e exercem a soberania através do voto. Os políticos se interessam muito por isso, dai que investem grandemente nos processos de recenseamento eleitoral.
Já que o Bilhete de Identidade possibilita ao cidadão a sua participação na sociedade como sujeito activo, a ideia que fica é, que ele se arranje se puder. É verdade que a cidadania tem e deve ter um custo, mas o Estado devia sim abreviar os encargos do povo moçambicano que já estão demasiadamente sobrecarregados com outros custos, principalmente os referentes aos impostos.
Uma das melhores formas de abreviar esse sofrimento dos cidadãos moçambicanos é oferecer-lhes um Bilhete de Identidade que para alem de dar-lhes a existência legal também os permita votar, os permita pagar impostos, os permita estar no sistema de segurança social, etc.
Não sendo isso possível, porque não oferecer os mesmos serviços do Cartão de Eleitor a quem quer um Bilhete de Identidade? Ao demais, no mínimo o moçambicano requer um Bilhete de Identidade uma vez a cada cinco anos enquanto que as campanhas de recenseamento e sua actualização acontecem pelo mesmos três vezes no período de cinco anos.
Ainda mais, porque as pessoas sabem que aquele cartão só serve para eleições, e a vontade do eleitor moçambicano já é muito reduzida, a contar com as abstenções nas urnas, alias, abstenções no próprio recenseamento e sua actualização.
É que, é mais fácil para o cidadão exercer seu dever cívico, votar por exemplo, quando o governo do dia sabe valorizar sua importância como poder constituinte, através de oferecimento de serviços públicos mais inclusivos e participativos, como é o caso de maiores facilidades para obter um Bilhete de Identidade.
Políticas Públicas constituem estratégias para resolver estes e outros problemas básicos dos cidadãos. É isso que falta em Moçambique, dai que seja mais difícil para um cidadão ter um Bilhete de Identidade que ter um Cartão de Eleitor.
O Estado coloca mesas de recenseamento em todo o país, em todas as províncias, distritos, localidades, postos administrativos, bairros, círculos e até ao ponto mais recôndito, em muitas situações até em tempos chuvosos. O Estado que conhece a importância desse cartão vai ate ao cidadão, faz campanhas, implora, ele tira fotos, importa computadores com geradores, forma técnicos informáticos, unem-se forças do partido no poder com as forças dos partidos na oposição para pedir que os cidadãos possam ir obter o cartão de Eleitor. Isso porque amanhã querem votos.
O Estado já não se empenha para que os mesmos cidadãos tenham um Bilhete de Identidade. Estes podem ser emitidos somente em três locais do país, Maputo, Beira e Nampula. Não há campanhas para Bilhetes de Identidade, nem do governo nem dos partidos políticos, as fotos não são gratuitas e os serviços de identificação civil não vão ao cidadão.
A mensagem passada aos moçambicanos, que acima de 60% vivem abaixo da linha de pobreza é: para tornar-te eleitor, farei todos os possíveis e até os impossíveis, mas para que sejas cidadão com existência legal, faça tu o que puderes.
Obrigado!